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Ano 2 (2016), n 4, 369-393
A HOLDING PATRIMONIAL FAMILIAR E SEUS
INCENTIVOS: UMA ANLISE JUSECONMICA
Cristiana Sanchez Gomes Ferreira1
Carolina Fagundes Leito2
Resumo: O presente estudo visa a promover uma anlise jur-
dica e econmica da adoo do planejamento sucessrio no
brasil, contexto no qual destacam-se as holdings familiares
patrimoniais. Tem como objetivo, em um primeiro momento,
esclarecer quais os benefcios da Anlise Econmica do Direito
na explicao de suas causas e provveis consequncias. Em
um segundo momento, objetiva-se analisar as caractersticas
especficas de cada alternativa de planejamento sucessrio,
com especial enfoque nas holdings familiares patrimoniais.
Palavras-Chave: Anlise Econmica do Direito. Planejamento
Sucessrio. Holdings Patrimoniais Familiares. Direito de
Famlia. Direito das Sucesses.
Abstract: The study aims to promote a legal and economic
analysis of adopting succession planning in Brazil, context in
which Family Holdings Companies are highlighted. Aims, at
first, to clarify the benefits of Economic Analysis of Law (Law
and Economics) in explaining its causes and likely conse-
quences. In a second step, the objective is to analyze the specif-
ic characteristics of each alternative of succession planning,
1 Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS). Advogada especializada em Direito de Famlia e Sucesses. Professora
de Direito de Famlia e Sucesses. 2 Ps-graduada em Processo Civil e Constituio pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul UFRGS. Especialista em Direito de Empresa pela Pontifcia Uni-
versidade Catlica do Rio de Janeiro PUCRJ. Advogada.
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with special focus on Family Holdings Companies.
Keywords: Law and Economics. Succession Planning. Family
Holdings Companies. Family Law. Inheritance Law.
INTRODUO
presente trabalho tem como escopo o estudo da
adoo do formato deas assim denominadas hol-
dings patrimoniais familiares para uma empresa
familiar, visando sucesso familiar e proteo
patrimonial. Para tanto, utilizar-se- do ferramen-
tal da Anlise Econmica do Direito, permitindo-se, assim, a
explorao de vantagens oriundas da interdisciplinaridade pro-
posta.
Muito embora a relao entre Direito e Economia seja
antiga, foi somente a partir dos anos 60 do sculo passado que
se iniciou o movimento cunhado de Law and Economics, que
trata da utilizao dos conceitos da Economia para a compre-
enso de fenmenos jurdicos e sofisticao na formulao das
leis, visando a torn-las cada vez mais eficientes. Para Rachel
Sztajn: Tomando a Economia como poderosa ferramenta para anali-
sar normas jurdicas, em face da premissa de que as pessoas
agem racionalmente, conclui-se que elas respondero melhor
a incentivos externos que induzam a certos comportamentos
mediante sistema de prmios e punies. Ora, se a legislao
um desses estmulos externos, quanto mais forem as normas
positivadas aderentes s instituies sociais, mais eficiente se-
r o sistema. 3
A Cincia Econmica parte da premissa de que os indi-
vduos buscam seus objetivos a partir da escolha de determina-
das formas de atuao, fenmeno denominado de racionalida-
3 SZTAJN, Rachel. Law and Economics in Direito e Economia, Org. ZYLBER-
SZTAJN, Dcio e STAJN, Rachel. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
O
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de. 4 Tendo-se o planejamento sucessrio, pois, como alterna-
tiva jurdica resultante de uma escolha tomada pelos agentes
visando reduo de custos fiscais, financeiros e, por vezes,
sobretudo, emocionais, muito tem a Law and Economics a con-
tribuir na explicao das causas que tm elevado a sua utiliza-
o no cenrio contemporneo brasileiro.
Em um primeiro momento, analisar-se- quais as prin-
cipais alternativas disponveis consecuo do planejamento
sucessrio no Brasil, para que, posteriormente, seja o enfoque
do estudo centrado na figura da holding familiar patrimonial,
mediante uma anlise de seus custos e benefcios em diversas
esferas.
1. O PLANEJAMENTO SUCESSRIO E A LAW AND ECONOMICS
A expectativa de significativo aumento da alquota do
Imposto de Transmisso Causa Mortis e Doao (ITCMD) e
a especulao acerca da instituio de tributo sobre as grandes
fortunas5 tm incentivado muitas famlias e empresrios a lan-
ar mo do planejamento sucessrio como forma de prevenir
elevados e inesperados custos.
O ITCMD (Imposto sobre a Transmisso Causa Mortis
e Doaes de quaisquer Bens ou Direitos) imposto de compe-
tncia estatal e do Distrito Federal, que incide quando da
transmisso no-onerosa de bens ou direitos, tal como ocorre
na herana (transferncia do patrimnio da titularidade do fale-
cido aos herdeiros) ou na doao, havendo variao de sua al-
quota de 4% a 8% no territrio nacional. Em agosto de 2015, o
Conselho Nacional de Poltica Fazendria (Confaz) encami-
nhou ao Senado proposta de majorao da alquota para 20%, o 4 FRIEDMAN, David D. Price Theory. Chicago: South-Western Publishing
Co.1986. p. 02. 5 O imposto sobre as grandes fortunas (IGF), embora previsto na CF/88, no regu-
lamentado.
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que potencializou a busca, por parte de gestores familiares, por
escritrios de advocacia especializados em planejamento su-
cessrio.
No Rio Grande do Sul, a Lei n. 14.741, de 24/09/2015,
substituiu as alquotas da tributao incidente sobre Causa
Mortis e Doaes. Na primeira hiptese, esta pode agora variar
de 0 a 6%; na segunda, de 3 a 4%. Referida majorao anali-
sada como um novo (e relevante!) incentivo para a busca de
alternativas de planejamento sucessrio no Rio Grande do Sul.
Verifica-se, portanto, que alteraes em leis fiscais (ou
to-somente a possibilidade de isto vir a ocorrer) criam incen-
tivos a que famlias com patrimnio significativo e/ou avessas
ao risco valham-se das alternativas disponveis em termos de
planejamento sucessrio, o que objeto de anlise da Law and
Economics. De acordo com Cristiano Carvalho, ao pesquisar a
influncia da tributao no comportamento humano: (...) a tributao uma das mais fortes intruses que o sistema
jurdico tem o condo de fazer na esfera de autonomia priva-
da. Por essa mesma aptido de afetar a liberdade individual,
os tributos so potentes estmulos ao comportamento humano,
aptos a alterar escolhas e aes do cidado. Surpreendente-
mente, a doutrina jurdica clssica (no apenas a tributria)
desenvolvida e ensinada em nossas plagas no se preocupa
com a relao entre normas jurdicas e comportamento indi-
vidual. A anlise econmica, por outro lado, enfoca precipu-
amente os incentivos gerados aos indivduos pelo sistema ju-
rdico, como tambm as consequncias efetivas acarretadas
pelos estmulos. 6
A anlise dos incentivos e desincentivos promoo do
planejamento sucessrio, bem como o sopesamento entre os
custos e benefcios de cada uma das alternativas viveis, cons-
titui-se, assim, em tpico fenmeno da anlise econmica do
direito.
O cenrio atual, no entanto, tem sido tomado por outros
6 CARVALHO, Cristiano. Anlise Econmica da Tributao in Direito e Economia
no Brasil. Org. TIMM, Luciano. So Paulo: Atlas, 2012.
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tipos de preocupaes que tm fomentado a busca pela mesma
ferramenta. Citemos os principais: 1) averso morosidade de
aes judiciais de inventrio; 2) instabilidade jurisprudencial
no mbito do Direito Sucessrio brasileiro (cujos julgados tm
se demonstrado substancialmente colidentes no que tange s
regras de quem herda e quanto herda sobretudo no que tange
s distintas regras entre a sucesso do cnjuge e do companhei-
ro); 3) custas judiciais expressivas; e, ainda, 4) litgios entre
os herdeiros, os quais, como sabido, podem culminar na de-
sestruturao de ncleos familiares.
A atribuio de custos tida, pois, como fator decisivo
na concepo do incentivo (ou no) estruturao de um pla-
nejamento sucessrio personalizado aos anseios dos titulares
dos bens, de modo que uma anlise econmica nos auxilia a
ponderar os interesses e buscar solues eficientes.
Simone Tassinari Cardoso define planejamento suces-
srio como o conjunto de atos, pesquisas, instrumentos jurdi-
cos que visam a atingir determinados objetivos, tendo em vista
a preocupao com o momento morte do titular de certa gama
patrimonial.7 Refere, a mesma autora, que alguns instrumen-
tos j podem ser considerados tradicionais em matria de pla-
nejamento sucessrio, tais como a) doao de bens em vida e a
b) transferncia dos bens para a chamada holding patrimonial,
cabendo citar, ainda, a c) formulao de testamentos.
2. DOAO DE BENS EM VIDA
Conforme define o art. 538 do Cdigo Civil brasileiro,
doao o contrato em que uma pessoa, por liberalidade,
transfere do seu patrimnio bens ou vantagens para o de ou-
tra. Muito embora a legislao brasileira autorize a celebra- 7 CARDOSO, Simone Tassinari. Algumas peculiaridades dos instrumentos tradicio-
nais de planejamento sucessrio. In O Direito no lado esquerdo do peito: ensaios
sobre direito de famlia e sucesses. Org. DA ROSA, Conrado Paulino; THOM,
Liane Maria Busnello. Porto Alegre: IBDFAM/RS, 2014.
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o do contrato por instrumento particular, as doaes de bens
imveis devem, rigorosamente, observar a forma pblica.
Por regra explcita do art. 544 do Cdigo Civil, a doa-
o de ascendente para descendente constitui em adiantamen-
to do que lhe cabe por herana, o que obriga os herdeiros do-
natrios a informar, quando do inventrio, quais bens recebe-
ram, para que assim se possa equalizar os quinhes entre os
herdeiros, instituto ao qual conferida a nomenclatura de co-
lao de bens, a ocorrer pelo valor atribudo ao(s) bem(ens)
no ato da liberalidade ou estimativa realizada na poca8. A co-
lao pode ser dispensada, no entanto, se expressa a sua dis-
pensa por parte do doador, quando ento tais bens sairo da sua
parte disponvel.
Ressalte-se que a doao realizada de ascendente para
descendente dispensa a anuncia dos demais filhos, o que so-
mente ocorre na venda ou permuta de bens com importncias
desiguais.9
Embora alguns detectem maiores custos do que benef-
cios na doao, salientando a perda de propriedade e do poder
dentro do negcio, bem como a inflexibilidade dos rumos do
patrimnio doado, outros, ao contrrio, compreendem que a
medida propicia que os herdeiros possam atuar melhor nos
negcios, j gozando da sensao de controle ou, ainda que
este esteja reservado, tenham a possibilidade de j praticar e
desenvolver habilidades essenciais ao negcio. 10
De acordo com Luiz Kignel, contudo, a estratgia com-
porta maiores desvantagens do que vantagens: Alm de no se
poder alterar a partilha efetuada (receio de alguns, como dito
antes), temerria a situao na qual, aps a transmisso, os
pais no sejam atendidos em seus reclamos materiais, que po-
8 Art. 2.004 do CCB. 9 CARDOSO, Simone Tassinari. Op. Cit., p. 297. 10 KIGNEL, Luiz; PHEBO, Mrcia Setti; LONGO, Jos Henrique. Planejamento
Sucessrio. So Paulo: Noeses, 2014, p. 61.
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deriam ser satisfeitos com parte do patrimnio doado.11
H que se referir, por fim, a possibilidade de a doao
dos bens ou quotas ocorrer mediante reserva do usufruto por
parte dos doadores, enquanto aos donatrios tocar a nua-
propriedade dos bens. A partir desta comum modalidade (do-
ao de bens com reserva de usufruto), os doadores, enquanto
vivos, permanecem no uso, gozo e administrao dos bens, a
incluir a percepo dos frutos e rendas que derivem da explora-
o do patrimnio. Quando operada sua morte, ento, ocorre a
consolidao da propriedade plena na pessoa dos donatrios.
A doao pode ainda agregar clusula de reverso, de
modo que, caso os doadores sobrevivam aos donatrios, os
bens retornem sua esfera patrimonial, no se destinando aos
seus herdeiros.
Ademais, tambm possvel a insero de clusulas de
inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, as
quais podem ser muito teis para a proteo do patrimnio fa-
miliar.
Cabe registrar que, mesmo que os bens doados no in-
tegrem o patrimnio conjugal dos filhos e filhas casados e con-
viventes sob o regime da comunho parcial de bens (ou sob o
regime da comunho universal, se houver clusula de incomu-
nicabilidade), indispensvel a vnia conjugal para sua aliena-
o na constncia do relacionamento. Assim, pode-se afirmar
que confiar que os filhos vendero os bens para dar suporte aos
genitores na advenincia de necessidade no suficiente, de-
pendendo-se da anuncia, pois, dos genros e das noras, salvo
no regime da separao total de bens.12
3. TESTAMENTO
O Direito das Sucesses tem fundamento na Constitui-
11 Ibidem, p. 61. 12 CARDOSO, Simone Tassinari. Op. Cit., p. 303.
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o Federal, artigo 5, inciso XXX13
, que consagra o direito de
herana. A matria tratada no Livro V do vigente Cdigo
Civil, entre os artigos 1.784 a 2.027. Na esfera processual,
aplicam-se as normas do Cdigo de Processo Civil, entre os
artigos 610 e 673 do novo diploma processual. A sucesso cau-
sa mortis consiste na transmisso dos bens da pessoa falecida
aos seus herdeiros, beneficirios esses que podem ter essa qua-
lificao por fora da lei (legtimos) ou por fora de testamento
(testamentrios).
Em suma, com a morte, restar aberta a sucesso14
,
transmitindo-se a herana aos herdeiros, sejam legtimos ou
testamentrios. Os primeiros dividem-se em duas classes: her-
deiros necessrios15
e facultativos16
. Aos primeiros, garantida
a metade dos bens deixados pelo falecido, o que se constitui na
legtima, consoante reza o art. 1.846 do CC17
.
Por outro lado, na sucesso fundada em testamento,
tem-se que o testador s poder dispor da metade da herana,
nos termos do art. 1.789 do CC18
.
Trata o testamento de ato personalssimo de carter re-
vogvel, o qual pode ser praticado por qualquer pessoa capaz,
respeitadas as normas legais e as limitaes havidas por lei,
devendo-se respeitar a legtima e as meaes dos cnjuges e
companheiros. Na hiptese de a liberdade ter sido extrapolada
13 Art. 5, XXX: garantido o direito de herana; 14 FRANKE, Leila Piske. Possibilidades jurdicas e viabilidade econmica na constituio
de empresas administradoras de bens prprios. Revista Jurdica, 2008. Disponvel em
. Acesso em 20/09/2015. 15 Art. 1.845 do CCB: So herdeiros necessrios os descendentes, os ascendentes e o
cnjuge 16 Caso o falecido no tenha deixado herdeiros necessrios ou feito testamento, sero
chamados sucesso os herdeiros facultativos, sendo assim chamados os compa-
nheiros e parentes colaterais at o 4 grau. Em no havendo herdeiros necessrios ou
facultativos, a herana declarada jacente e destinada ao ente pblico. 17 Art. 1.846 do CCB: Pertence aos herdeiros necessrios, de pleno direito, a metade
dos bens da herana, constituindo a legtima. 18 Art. 1.789. Havendo herdeiros necessrios, o testador s poder dispor da metade
da herana.
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pelo testador, utiliza-se o expediente de reduo das disposi-
es testamentrias, mediante ao judicial com a finalidade
de ajustar o testamento, proporcionalmente, disposio per-
mitida em lei.
De acordo com Luiz Kignel, o testamento deve ser uti-
lizado para: (i) Compor direito patrimonial do cnjuge ou companheiro
sobrevivente, conforme o regime de bens adotado pelo casal;
(ii) organizar o pagamento da parcela legtima aos herdeiros
necessrios; (iii) dispor sobre a diviso da parcela disponvel;
(iv) atribuir encargos e/ou condies na transmisso de parce-
la determinada dos bens; (v) efetuar liberalidades patrimoni-
ais para terceiros; (vi) se for o caso, dispensar os herdeiros da
colao; (vii) nomear curadores especiais quando houver her-
deiros menores ou incapazes; (viii) nomear tutores, nas mes-
mas condies do item anterior; (ix) dispor sobre a ratificao
de acordos societrios, termos e compromissos firmados pelo
testador; (x) reconhecer a paternidade; (xi) nomear inventari-
ante para administrar os bens do esplio desde o falecimento
at a partilha; e (xii) nomear testamenteiro para executar as
disposies testamentrias.19
Em comparao com a doao, vejamos que, ao contr-
rio desta, o testamento revogvel e retratvel, podendo o tes-
tador, de forma unilateral e a qualquer tempo, alterar as dispo-
sies testamentrias ou mesmo revog-las. Ademais, no h
pagamento de qualquer imposto pelo ato, o que postergado
para o momento do inventrio (o fato gerador, afinal, o bito
do testador). Ocorre, to somente, o pagamento de emolumen-
tos ao tabelionato de notas na hiptese de o formado adotado
for o pblico.
O caminho do testamento costumeiramente adotado
para que sejam evitados conflitos entre herdeiros, pois aps a
morte do testador no h mais espao para discusses sobre o
mrito da herana. Porm, a problemtica das empresas no
resta solucionada via testamento, ao qual no se permite defini-
19 KIGNEL, Luiz; PHEBO, Mrcia Setti; LONGO, Jos Henrique. Op. Cit., p. 79.
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es de distribuio de funes no mbito das unidades produ-
tivas, por exemplo, para o que a criao da holding familiar
pode ser uma soluo, como se ver adiante.
4. HOLDING FAMILIAR E PATRIMONIAL
A expresso holding tem origem na lngua inglesa e,
traduzida para o portugus, significa segurar, manter, controlar,
guardar. Tal ideia tem aplicao direta ao direito societrio,
tanto brasileiro quanto mundial, que denominam justamente de
holdings determinadas sociedades, em termos adiante detalha-
dos.
O art. 982 do Cdigo em Civil vigente20
divide as soci-
edades em dois grupos: sociedades simples e sociedades em-
presrias. As primeiras, se organizam de forma simples, da
mesma forma que suas atividades se desenvolvem de forma
simples. No que tange s segundas, conforme Gladston Mame-
de e Eduarda Cotta Mamede, h um tipo especfico de ativi-
dade negocial que caracteriza a empresa: a atividade econ-
mica organizada para a produo ou circulao de bens ou de
servios, sendo, o elemento central, a organizao dos meios
sob a forma de empresa21
.
A holding, por sua vez, no se constitui em espcie so-
cietria autnoma, precisando se revestir sob a forma de algu-
ma dessas espcies, simples ou empresria, nos termos disci-
plinados pelo Cdigo Civil, para que possa assumir personali-
dade jurdica, devendo, inclusive, respeitar os requisitos ineren-
tes ao modelo escolhido. 20 Art. 982 do CCB: Salvo as excees expressas, considera-se empresria a
sociedade que tem por objeto o exerccio de atividade prpria de empresrio sujeito
a registro (art. 967); e, simples, as demais.
Pargrafo nico. Independentemente de seu objeto, considera-se empresria a
sociedade por aes; e, simples, a cooperativa. 21 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Holding familiar e suas
vantagens: planejamento jurdico e econmico do patrimnio e da sucesso
familiar. 4. ed. So Paulo: Atlas, 2013, p. 11.
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Para os autores sobreditos, Gladston Mamede e Eduarda
Cotta Mamede, no h limitao classificao das holdings,
que podero, assim, ser sociedades simples ou empresrias, a
depender do tipo societrio que adotarem22
devendo ser re-
gistradas ou no Registro Civil de Pessoas Jurdicas, ou na Junta
Comercial, de acordo com a escolha, respectivamente23
.
Inicialmente, refere-se que h, na doutrina, entendimen-
to no sentido de que a sociedade limitada a forma de organi-
zao mais indicada para as holdings, j que acarreta em maio-
res vantagens, benefcios e economia, por haver maior flexibi-
lidade de decises, menor burocracia e maior controle, custos
menores e responsabilidade limitada ao capital.
No que tange s espcies de holdings propriamente di-
tas, para Joo A. Borges Teixeira24
, dentre as principais se des-
tacam:
A holding pura, que pode ser definida como a socieda-
de cujos escopos principais so a aquisio, titularidade, alie-
nao e controle de participaes societrias. Tais escopos so
exercidos com profissionalismo, vez que a holding os tem co-
mo principal atividade e razo da sua existncia, como vrtice
e estrutura de controle (conforme art. 2, 1 e 225
c/c art.
22 Tipos societrios esses sobre os quais os autores Gladston Mamede e Eduarda
Cotta Mamede referem o que segue: as sociedades empresrias podem adotar,
segundo o Cdigo Civil, (1) sociedade em nome coletivo, (2) sociedade em
comandita simples, (3) sociedade limitada, (4) sociedade annima ou (5) sociedade
em comandita por aes, ao passo que as sociedades simples podem optar por (1)
sociedade simples em sentido estrito, (2) sociedade em nome coletivo, (3) sociedade
em comandita simples, (4) sociedade limitada ou (5) sociedade cooperativa. 23 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Op. Cit., p. 13. 24 TEIXEIRA, Joo A. Borges. Holding familiar & proteo patrimonial. So
Paulo: 2011. Disponvel em: http://www.fiscosoft.com.br/a/3gw6/holding-familiar-
tipo-societrio-e-seu-regime-tributario-joao-alberto-borges-teixeira. Acesso em
15/09/2015. 25 Art. 2 Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, no
contrrio lei, ordem pblica e aos bons costumes.
1 Qualquer que seja o objeto, a companhia mercantil e se rege pelas leis e usos
do comrcio.
2 O estatuto social definir o objeto de modo preciso e completo.
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, ambos da Lei 6.404/76 c/c art. 1.053, par. nico, do
CC27
). Em outras palavras, holdings puras, por definio, so
meios de organizao patrimonial e no influenciam os resulta-
dos das controladas mais do que o fazem os controladores pes-
soas fsicas28
.
A holding mista, que aquela que, alm da participa-
o, exerce explorao de alguma atividade empresarial. No
Brasil, por questes fiscais e administrativas, a espcie de
holding mais utilizada29
.
J a holding familiar, conforme ensinamento de Adol-
pho Bergamini, aquela que controla o patrimnio de uma ou
mais pessoas fsicas, ou seja, ao invs de as pessoas fsicas
possurem bens em seus prprios nomes, passam a possu-los
atravs de uma pessoa jurdica a controladora patrimonial,
que geralmente se constitui na forma de sociedade limitada,
que, via de regra, tem a seguinte denominao social: Empre-
endimentos ou Participaes Ltda30
. Com isto, consoante pala-
vras de Fred John Santana Prado, facilita-se a administrao
dos bens e a sucesso hereditria, garantindo a manuteno das
empresas em nome dos descendentes do sucessor. Ademais,
esta sociedade pode ter maiores benefcios fiscais e proteo
patrimonial31
.
26 J anteriormente transcrito. 27 Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omisses deste Captulo, pelas
normas da sociedade simples.
Pargrafo nico. O contrato social poder prever a regncia supletiva da sociedade
limitada pelas normas da sociedade annima. 28 LODI, Joo Bosco; LODI, Edna Pires. Holding. 4. ed. So Paulo: Cengage
Learning, 2012, p. 4-5. 29 Ibidem. p. 5. 30 BERGAMINI, Adolpho. Constituio de empresa Holding Patrimonial, como
forma de reduo de carga tributria da pessoa fsica, planejamento sucessrio e
retorno de capital sob a forma de lucros e dividendos, sem tributao. Revista Jus
Vigilantibus, 2003, p. 107. 31 PRADO, Fred John S. A holding como modalidade de planejamento patrimonial
da pessoa fsica no Brasil. Jus Navigandi. 2011, p. 87. Disponvel em:
http://jus.com.br/revista/texto/18605. Acesso em: 22/4/2013.
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H outras classificaes menos expressivas na doutrina,
tais quais: holding administrativa, holding de controle, holding
de participao ou holding imobiliria, sobre as quais se deixa-
r de discorrer diante da menor expressividade quanto ao tema
ora em anlise.
Colaciona-se, abaixo, interessante entendimento de
Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede sobre a holding
familiar: A chamada holding familiar no um tipo especfico, mas
uma contextualizao especfica. Pode ser uma holding pura
ou mista, de administrao, de organizao ou patrimonial, is-
so indiferente. Sua marca caracterstica o fato de se encar-
tar no mbito de determinada famlia e, assim, servir ao pla-
nejamento desenvolvido por seus membros, considerando de-
safios como organizao do patrimnio, administrao de
bens, otimizao fiscal, sucesso hereditria etc32
.
Segundo Tavares Borba, o contrato social destas socie-
dades, se limitadas, estipula as regras de administrao inter
vivos, ou, na hiptese de sucesso, o fundador escolhe quem e
como sero geridos a sua empresa e seus bens na sua ausn-
cia.33
Em suma, so caractersticas da holding familiar: a)
com ela administra-se patrimnio prprio ou da famlia; b)
pode ser manter a administrao sob o controle do fundador; c)
seu capital social integralizado atravs da incorporao de
bens mveis, imveis, dinheiro e outros direitos. Todos estes
ativos so transferidos dos scios para a holding; d) a socieda-
de passa a auferir as rendas decorrentes dos ativos transferidos;
e) a sociedade no deve participar de atividades de risco.
No que tange aos objetivos da holding familiar, tem-se
justamente: a) a segurana patrimonial; b) o planejamento tri-
butrio, com reduo da carga fiscal; c) organizao do patri-
mnio familiar/da sucesso. No entanto, por certo, o uso dessa
32 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Op. Cit., p. 9. 33 BORBA, Jos Edwaldo Tavares. Direito Societrio. 8. ed., Rio de Janeiro
Renovar, 2003.
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faculdade jurdica, no pode ser optado por motivaes ilegais,
ou seja, com vistas a burlar direitos sucessrios, direitos de
credores, regimes de casamento ou quaisquer outros.
Segundo Rafael Diogo Pereira, ademais, a criao da
holding familiar, garante que as questes familiares sejam iso-
ladas das questes patrimoniais, separando eventuais conflitos
internos34
. Lanando-se mo deste tipo de pessoa jurdica, os
problemas pessoais ou familiares no a afetaro, j que, nestas
situaes, no sero as pessoas fsicas, tomadas por emoo,
que definiro as diretrizes a serem seguidas, mas sim, a prpria
holding.
Ou seja, as relaes passam a ser submetidas s regras
de direito societrio e no mais do direito de famlia35
(haven-
do, por conseguinte, a necessidade de os scios respeitarem a
affectio societatis e o envolvimento e comprometimento da
famlia com os objetivos da pessoa jurdica).
Nesta senda, consoante o que preleciona Tiago Pereira
Barros, a adoo da holding familiar proporcionar a conti-
nuidade dos negcios, afastando as ingerncias de parentes e
protegendo o patrimnio dos herdeiros com a preservao dos
bens perante os negcios da sociedade, sendo certo que a ar-
guio de nulidade destas doaes somente poder ser feita por
herdeiro necessrio ou terceiro prejudicado. 36
37
34 PEREIRA, Rafael Diogo, et al. Governana, Sucesso e Profissionalizao em
uma Empresa Familiar: arranjando o lugar da famlia multigeracional. Revista
Brasileira de Gesto de Negcios, 2012. So Paulo, v. 14, n. 43, p. 176-191. 35 ROCHA, Pedro Figueiredo; SANTOS, Andr Felipe. Holding Familiar. Tibrcio
Rocha 2014, p. 9-10. Disponvel em: http://www.tiburciorocha.com.br/wp-
content/uploads/2012/03/Artigo-Holding-Familiar.pdf. Acesso em 15/09/2015. 36 BARROS, Tiago Pereira. Planejamento sucessrio e holding familiar/patrimonial.
Jus Navigandi. 2013. Disponvel em: http://jus.com.br/artigos/23837/planejamento-
sucessorio-e-holding-familiar-patrimonial. Acesso em 13/09/2015. 37 Em explicao ideia das doaes referida pelo autor, colaciona-se outro trecho
constante da mesma obra: A holding familiar constitui uma forma preventiva e
econmica se de realizar a antecipao da herana, pois o controlador poder doar
aos seus herdeiros as quotas-partes da companhia gravando-as com clusula de
usufruto vitalcio em favor do doador, assim como de impenhorabilidade,
RJLB, Ano 2 (2016), n 4 | 383
No que se refere proteo contra terceiros, tambm
chamada de blindagem patrimonial, Juliana Paola Avilla Petrin
e Ricardo Pereira Rios elucidam: Atualmente a maior preocupao do empresrio em relao
ao patrimnio seria o envolvimento e vinculao de seus bens
particulares e do grupo. Nesse contexto, a Holding permite
uma blindagem patrimonial, uma vez que todos os seus bens
e participaes societrias passam para a Holding, evitando
que estes sejam atingidos por eventuais processos judiciais,
que ocasionalmente, possam vir a ocorrer e acabar com aquilo
que foi construdo em uma ou mais geraes38
.
Os mesmos autores ainda completam a ideia acima, na
mesma obra, referindo que para que o risco sobredito seja eli-
dido, indicado est que se gravem as quotas sociais da holding
com a clusula de impenhorabilidade39
. Indo alm, Tiago Pe-
reira Barros aduz que o controlador poder doar aos seus her-
deiros as quotas-partes da companhia, gravando-as com clusu-
la de usufruto vitalcio em favor do doador, assim como de
incomunicabilidade40
, inalienabilidade41
e reverso42
, alm de
impenhorabilidade43
.
Vale lembrar, apenas, quanto questo da blindagem
ora em comento, que o doador das quotas da holding familiar
no poder ficar insolvente aps as doaes, sob pena de anu-
lao da(s) doao(es) por fraude a credores. E, ainda, conso-
incomunicabilidade, inalienabilidade e reverso. 38 PETRIN, Juliana Paola Avilla; RIOS, Ricardo Pereira. A Holding e o Processo da
Sucesso Familiar. Revista Eletrnica Gesto e Negcios, 2014. Vol. 5, n 1, p. 18.
Disponvel em:
http://www.uninove.br/marketing/fac/publicacoes_pdf/administracao/v5_n1_2014/J
uliana.pdf. Acesso em 03/09/2015. 39 PETRIN, Juliana Paola Avilla; RIOS, Ricardo Pereira. Op. Cit., p. 18. 40 No comunicar com cnjuge ou companheiro(a). 41 Impedir que o herdeiro/donatrio disponha das quotas e possa trazer pessoas
estranhas famlia sociedade. 42 Em caso de falecimento prvio do herdeiro/donatrio, as quotas retornaro ao
doador. 43 BARROS, Tiago Pereira. Op. Cit., p. 2.
384 | RJLB, Ano 2 (2016), n 4
ante reza o art. 593 do CPC44
, as transferncias dos ativos pa-
trimoniais devem ser feitas sociedade antes do ajuizamento
de aes e execues, bem como a inscrio em dvida ativa,
sob pena de fraude execuo.
Ainda neste contexto, o scio que estiver em condies
de risco deve sair da holding ou reduzir significativamente a
sua participao, afinal, as dvidas particulares do scio podem
atingir a sociedade na forma do art. 1.026 do CC, caput e par-
grafo nico45
, e, ainda, art. 123, caput e pargrafo primeiro, da
Lei de Falncias (Lei 11.101/2002)46
. Isto porque, como bem
doutrinam Marcelo Lima Guerra e Jos Carlos Bastos Silva
Filho, pode ser operada a desconsiderao da personalidade
jurdica quando houver fraude e/ou abuso de direito por parte
dos scios da sociedade. Ou seja, em situaes excepcionais
como as relatadas, as dvidas da sociedade sero redirecionadas
para os scios se a sociedade no puder sald-las, mesmo que
se trate de sociedade por responsabilidade limitada.47
48
44 Art. 593. Considera-se em fraude de execuo a alienao ou onerao de bens:
I - quando sobre eles pender ao fundada em direito real;
II - quando, ao tempo da alienao ou onerao, corria contra o devedor demanda
capaz de reduzi-lo insolvncia;
III - nos demais casos expressos em lei. 45 Art. 1.026. O credor particular de scio pode, na insuficincia de outro bens do
devedor, fazer recair a execuo sobre o que a este couber nos lucros da sociedade,
ou na parte que lhe tocar em liquidao.
Pargrafo nico. Se a sociedade no estiver dissolvida, pode o credor requerer a
liquidao da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, ser
depositado em dinheiro, no juzo da execuo, at noventa dias aps aquela
liquidao. 46 Art. 123. Se o falido fizer parte de alguma sociedade como scio comanditrio ou
cotista, para a massa falida entraro somente os haveres que na sociedade ele possuir
e forem apurados na forma estabelecida no contrato social ou estatuto social.
1. Se o contrato ou estatuto social nada disciplinar a respeito, a apurao far-se-
judicialmente, salvo se, por lei, pelo contrato ou estatuto, a sociedade tiver de
liquidar-se, caso em que os haveres do falido, somente aps o pagamento de todo o
passivo da sociedade entraro para a massa falida. 47 GUERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteo do credor na execuo
civil. So Paulo: RT, 1998, p. 83. 48 FILHO, Jos Carlos Bastos Silva. A desconsiderao da personalidade jurdica na
RJLB, Ano 2 (2016), n 4 | 385
A constituio da pessoa jurdica, com a reverso do pa-
trimnio da pessoa fsica para o capital social da primeira,
permite ao scio administrador dispor destes bens sem a anu-
ncia do cnjuge (tambm denominada de outorga uxria), seja
qual for o regime de casamento. O doador das quotas ou aes
pode, inclusive, gravar os ttulos, como j se viu, com a clusu-
la de inalienabilidade, nos termos do art. 1.911 do CC49
, que,
por sua vez, implica em impenhorabilidade e incomunicabili-
dade mas, obrigatoriamente, fundamentando este ato, caso
seja realizado atravs de testamento, consoante dispe o art.
1.848 do CC50
.
Importa salientar que, na hiptese de ser a holding cons-
tituda sob a forma de sociedade contratual, ainda que limitada,
o art. 1.027 do CC51
probe o cnjuge ou companheiro a exigir,
desde logo, a parte que lhe toca na quota social; deve, isto sim,
requerer a liquidao das quotas, permitindo aos demais scios
(membros da famlia) entregar-lhe dinheiro, e no participao
societria 52
53
.
O capital social da holding familiar ser constitudo
mediante a integralizao dos bens imveis pertencentes ao
patriarca/ matriarca. Diego da Silva Viscardi no aconselha a
realizao da integralizao com bens mveis ou automveis,
execuo trabalhista frente jurisprudncia do Tribunal Superior do Trabalho. Jus
Navigandi. 2008, p. 1. Disponvel em: http://jus.com.br/artigos/12634/a-
desconsideracao-da-personalidade-juridica-na-execucao-trabalhista-frente-a-
jurisprudencia-do-tribunal-superior-do-trabalho. Acesso em: 10/09/2015. 49 Art. 1.911. A clusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de
liberalidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade. 50 Art. 1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, no pode o
testador estabelecer clusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de
incomunicabilidade, sobre os bens da legtima. 51 Art. 1.027. Os herdeiros do cnjuge de scio, ou o cnjuge do que se separou
judicialmente, no podem exigir desde logo a parte que lhes couber na quota social,
mas concorrer diviso peridica dos lucros, at que se liquide a sociedade. 52 Neste caso, o scio ex-cnjuge dever transferir, de sua parte, aos demais scios,
o equivalente ao que estes arcaram para indenizar o seu meeiro. 53 MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Op. Cit., p. 75.
386 | RJLB, Ano 2 (2016), n 4
por exemplo, j que tm elevada taxa de depreciao54
.
Para a integralizao, o valor atribudo aos bens im-
veis ser aquele constante Declarao de Imposto de Renda
da Pessoa Fsica do patriarca, do ano-calendrio vigente e
no, pelo valor de mercado do bem (vide art. 132 do Decreto n
3.000/9955
). Aqui, haver, pois, uma enorme vantagem tribut-
ria comparativamente sucesso feita atravs de inventrio, j
que, neste ltimo, a avaliao feita pela Secretaria da Fazenda
e a tributao pelo valor de mercado, que, quase sempre, mui-
to superior ao da referida Declarao. E, em se mantendo o
valor j declarado, no incidir imposto sobre ganho de capital,
que no ter supostamente havido.
Sob a presente perspectiva de anlise dos custos e bene-
fcios inerentes constituio de uma holding familiar, e de
modo a facilitar importantes compreenses, apresenta-se as
tabelas comparativas abaixo: na primeira, compara-se as vanta-
gens da holding familiar em relao ao inventrio; nas demais,
apresenta-se tabelas que ilustram as principais vantagens fisca-
is oriundas da estruturao de uma holding patrimonial familiar
quando em comparao carga tributria enfrentada por pessoa
fsica:
Eventos Holding Familiar Inventrio
54 VISCARDI, Diego da Silva. Holding Patrimonial: As Vantagens Tributrias e o
Planejamento Sucessrio. JurisWay. 2013. Disponvel em:
http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=12303. Acesso em 20/09/2015. 55 Art. 132. As pessoas fsicas podero transferir a pessoas jurdicas, a ttulo de
integralizao de capital, bens e direitos, pelo valor constante da respectiva
declarao de bens ou pelo valor de mercado.
1 Se a transferncia for feita pelo valor constante da declarao de bens, as
pessoas fsicas devero lanar nesta declarao as aes ou quotas subscritas pelo
mesmo valor dos bens ou direitos transferidos, no se aplicando o disposto no art.
464.
2 Se a transferncia no se fizer pelo valor constante da declarao de bens, a
diferena a maior ser tributvel como ganho de capital.
RJLB, Ano 2 (2016), n 4 | 387
1) Tributao da Herana e Doao 4% 4%
2) Tempo para Criao ou Tempo de
Trmite do Inventrio
30 dias em mdia 5 anos em m-
dia, se judicial
3) Tributao dos Rendimentos 11,33% 27,5%
4) Tributao da Venda de Bens Im-
veis
6,5456
% 27,5%
5) Sucesso conforme Cdigo Civil
para Casamentos com Comunho
Parcial de Bens
Cnjuge NO
herdeiro
Cnjuge her-
deiro
Imveis no No Circulante Conta Investimentos:
Atividade: Aluguel de imveis prprios
Tributo Base de Clculo Alquota Custo Tributrio
Final
IRPJ 32% do faturamento 15% 4,8%
CSLL 32% do faturamento 9% 2,88%
PIS 100% do faturamento 0,65% 0,65%
COFINS 100% do faturamento 3% 3%
TOTAL 11,33%
Atividade: Locao de Imveis - Tributao:
Holding Patrimonial: 11,33%
Pessoa Fsica: 27,5%
Atividade: Alienao de Imveis Ganho de Capital:
Holding Patrimonial Estoque de
Imveis
Pessoa Fsica
6,54% 15%
Como em tudo na vida, as holdings57
no tm somente
56 O custo tributrio final ser de 5,93%, mais o adicional, se chegando a dzima
peridica de aproximadamente 6,54% sobre o valor total da alienao, e no sobre o
ganho de capital propriamente dito, como na tributao da pessoa fsica.
388 | RJLB, Ano 2 (2016), n 4
vantagens. Tm, igualmente, na mo inversa, alguns pontos
negativos, os quais merecem anlise. So eles, nas palavras de
Flvia Martins D. Varoto Cardoso: Aspectos financeiros: no pode usar prejuzos fiscais (no caso de holding pura); tem maior carga tributria se no exis-
tir adequado planejamento fiscal; ter tributao de ganho de
capital na venda de participaes; ter maior volume de despe-
sas com funes centralizadas, o que pode provocar proble-
mas dos sistemas de rateio; e ter imediata compensao de lu-
cros e perdas das investidas, pela equivalncia patrimonial.
Aspectos administrativos: elevada quantidade de nveis hierrquicos, o que aumenta o risco inerente qualidade e
agilidade do processo decisrio (no caso de holding controla-
dora); e no ter adequado nvel de motivao nos diversos n-
veis hierrquicos, pela perda de responsabilidade.
Aspectos legais: dificuldades em operacionalizar os trata-mentos diferenciados dos diversos setores da economia; e ter
problemas em operacionalizar as diversas situaes provoca-
das pelas diferenas regionais.
Aspectos societrios: consolidao do tratamento dos as-pectos familiares entre quatro paredes, criando uma situao
irreversvel e altamente problemtica58
.
CONCLUSO
O presente trabalho buscou abordar, de forma interdis-
ciplinar sob as concepes jurdica e da Law and Economics
-, o planejamento sucessrio no Brasil. Verificou-se, inicial-
mente, que alteraes legislativas de natureza tributria vm
criando significativos incentivos para a adoo de ferramentas
de planejamento sucessrio.
A anlise dos incentivos e desincentivos promoo do
planejamento sucessrio, bem como o sopesamento entre os
57 Aqui refere-se s holdings de forma genrica e no apenas as
patrimoniais/familiares, s quais, inclusive, nem se aplicam algumas das
desvantagens sobreditas. 58 CARDOSO, Flvia Martins D. Varoto. Holding Familiar. Contagem: GCONT,
2014. p. 5 apud OLIVEIRA.
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custos e benefcios de cada uma das alternativas viveis, cons-
titui-se, assim, em tpico fenmeno da anlise econmica do
direito, o qual auxilia e muito na compreenso das razes
que levam a sociedade a lanar mo do ferramental do plane-
jamento sucessrio.
Como principais causas, verifica-se: 1) averso moro-
sidade de aes judiciais de inventrio; 2) instabilidade juris-
prudencial no mbito do Direito Sucessrio brasileiro (cujos
julgados tm se demonstrado substancialmente colidentes no
que tange s regras de quem herda e quanto herda sobretudo
no que tange s distintas regras entre a sucesso do cnjuge e
do companheiro); 3) custas judiciais expressivas; e, ainda, 4)
litgios entre os herdeiros, os quais, como sabido, podem
culminar na desestruturao de ncleos familiares.
No mbito do planejamento sucessrio, tm havido des-
taque eleio das Holdings Familiares Patrimoniais como
alternativa. Desta forma, ao longo deste trabalho se pde per-
ceber que o desenvolvimento de uma holding familiar possibi-
lita a sobrevivncia de um patrimnio familiar, trazendo bene-
fcios significativos tanto no plano sucessrio (eliminando cus-
tos) quanto tributrio (sendo uma boa forma de eliso fiscal).
Outrossim, sociedades deste tipo possibilitam uma me-
lhor administrao ao permitirem que o processo sucessrio
ocorra por meio de decises esclarecidas e participativas, mi-
nimizando riscos e conflitos futuros, afinal, ser a pessoa jur-
dica que tomar as decises aps a morte do(a) patriar-
ca/matriarca, na forma constante do contrato social, pois, e no
as pessoas fsicas imbudas por grande emoo. Ademais, o
quinho de cada participante j fica definido previamente (seja
por doao, seja por testamento), evitando ansiedades ou brigas
por parte da linha sucessria.
As holdings familiares tm outra vantagem: funcionam
como blindagem patrimonial, evitando que o patrimnio seja
atingido por variveis financeiras ou judiciais, das quais nin-
390 | RJLB, Ano 2 (2016), n 4
gum est livre.
Da mesma forma, impedem que o patrimnio seja dila-
pidado ao trmino de relacionamentos amorosos mal sucedi-
dos, j que os bens transferidos para a pessoa jurdica no mais
pertencero ao(s) cnjuge(s).
No por outra razo, as holdings familiares esto cada
vez mais presentes no mbito empresarial, se fazendo uma al-
ternativa bastante vlida e eficaz de planejamento do patri-
mnio da pessoa fsica. Estamos convencidas que as vantagens
superam as desvantagens e que a criao da holding familiar
no se trata de meio de se beneficiar financeiramente atravs de
ilegalidades, mas sim, por meio de planejamentos estratgicos
legais, que podem gerar consequncias positivas para a famlia
e para a empresa.
Porm, cumpre grifar que o sucesso da holding depen-
der da adoo de recursos estratgicos compatveis ao caso
concreto, mediante apurado planejamento, estabelecimento de
padres e metas, preocupao com os resultados das empresas
operacionais e, sobretudo, permanncia do affectio societatis
no grupo familiar, o que possibilitar a boa gesto empresarial
e gerao dos frutos esperados.
e
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